Pausa na Viagem: "FELIZES PARA SEMPRE?": Por que a minissérie da Globo foi - e continua sendo - necessária
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"FELIZES PARA SEMPRE?": Por que a minissérie da Globo foi - e continua sendo - necessária

(Da esquerda para a direita: Adriana Esteves, João Miguel, Maria Fernanda Cândido, Enrique Diaz, João Baldasserini e Carol Abras, o elenco central da minissérie. / Imagem: Divulgação.)


Sim, esta é a primeira vez que falo de um assunto relacionado a televisão aqui no blog. Mas certamente não será a última. Motivo? Ao contrário de muita gente nessa blogosfera literária, eu não tenho a necessidade birrenta de separar livros e TV, como se um veículo fosse superior ou inferior ao outro. Se buscamos a literatura por prazer e distração, talvez até conhecimento, por que não podemos admitir que o mesmo se dá com a televisão, a internet, o cinema...?
 
Enfim, não se pode negar que, em tempos de internet, a TV continua sendo o meio de comunicação mais difundido no Brasil. O mais acessível, pelo menos. Quem nunca assistiu ao futebol nas quartas à noite ou tirou uma hora para acompanhar o último capítulo da novela, que atire a primeira pedra.
 
Geralmente, a programação brasileira se constrói nos moldes do popular, do entretenimento puro e simples, aquilo que o povo (sem conotação classista, mas no sentido geral da palavra) gosta e quer ver. Lembrando que é a constatação de um fato, e não um juízo de valor. Eu mesmo já fui um telespectador assíduo, desses que sabem dizer a ficha técnica da novela de cor e salteado. Hoje estou meio por fora, mas continuo gostando do gênero.
 
De vez em quando, porém, surgem na telinha algumas ousadias que desafiam o espectador comum. São produções que primam pela qualidade técnica, embora não apresentem garantias de audiência ou sucesso de crítica. Também costumam ser polêmicas, tanto na embalagem quanto no conteúdo. Este é o caso de Felizes Para Sempre?, co-produção da Globo com a O2, exibida entre janeiro e fevereiro deste ano.
 
 
(Paolla Oliveira na pela da prostituta Danny Bond, em Felizes Para Sempre? / Imagem: Globo/Divulgação)



Releitura da minissérie Quem Ama Não Mata (1982), Felizes Para Sempre? surgiu, ironicamente, como uma inovação na teledramaturgia nacional. Além da ambientação em Brasília - uma ruptura com a tradicional "Rio-São Paulo" -, nunca antes uma série global discutiu tão abertamente aquelas questões da vida que todos nós preferimos manter debaixo do tapete. Inclui-se aqui as tensões familiares, abordadas com um tratamento realista, e a sexualidade, destrinchada sem qualquer pudor ou preconceito.

Nesta crônica policial, capitaneada por Paolla Oliveira no papel da prostituta Danny Bond (seu melhor papel até agora), não existiram bandidos ou mocinhos. O que se viu nos deliciosos 10 capítulos da série foram seres humanos palpáveis, possíveis, que poderiam muito bem ser nossos vizinhos ou contatos do Facebook. Cada qual com sua própria espiral de sentimentos, emoções, qualidades e defeitos.

Independente dos índices de audiência, Felizes Para Sempre? foi um sucesso, trazendo ao horário nobre um texto moderno, uma direção inspirada e um elenco que deu conta do recado, para dizer o mínimo.

Apesar de tudo, cabe citar a máxima de que nada é perfeito. A minissérie, escrita por Euclydes Marinho e dirigida por Fernando Meirelles, não surtiu o mesmo efeito para a legião de espectadores insatisfeitos que se manifestaram nas redes sociais. E o mais triste nessa história é que não se pode culpar os autores, os produtores e nem mesmo a Rede Globo. A culpa, a meu ver, é da ignorância. Ou da hipocrisia. Ou de ambas.

Era de se esperar que, em um país hiper-sexualizado que vive à flor da pele, a cena protagonizada pelas nádegas de Paolla Oliveira em um quarto de hotel fosse render certa repercussão. De fato, repercutiu. Viralizou. E irritou. Longe de qualquer moralismo, afinal, do alto da minha homossexualidade, deixo registrado por escrito: que bunda, hein, Paolla?... O problema é que a atriz sempre foi conhecida por sua beleza e sensualidade, então, cadê a novidade, meu chapa?

É aí que entra a hipocrisia do público brasileiro. Basta acessar qualquer post relacionado à série nas páginas administradas pela Globo para se deparar com comentários do gênero: "destruição da família brasileira", "putaria", "pornografia gratuita" e por aí vai. Sério, gente? O ser humano evoluiu até o ano de 2015 para simplesmente morrer na praia? Quando é que vamos assumir para nós mesmos que o sexo e a sexualidade fazem parte da natureza, da vida e até mesmo da família que tais comentários insistem em "defender"? Em que capítulo da minissérie a nudez artística e o sexo não explícito se confundiram com pornografia? E se você sente desejo e transa na vida real, por que seria errado retratar isso na TV, em um programa direcionado ao público adulto??

Enfim, chega a dar desgosto o nível de puritanismo hipócrita que se espalha como uma peste pela nossa sociedade. Sonho com o dia em que ninguém terá problemas em conversar sobre sexo com o filho adolescente, ninguém olhará torto para um casal gay na rua e em que todos terão informação e consciência suficientes para que não precisem se privar dos prazeres que a vida oferece, mas possam desfrutá-los com responsabilidade. Até lá, a TV brasileira não pode se furtar em produzir pérolas como Felizes Para Sempre?, uma vez que elas são, de certa forma, necessárias.


 
 
 




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